O sotaque paraibano ainda incomoda muita gente. Parece mentira, mas infelizmente não é.
A personal trainer Adriana Borba, noiva do jogador Léo Campos, do Botafogo ficou famosa depois que viralizou fazendo chacota do jeito de falar dos paraibanos. Repetindo com trejeitos caricaturais expressões muito nossas como “oxe” e “mulesta”. E pra completar reclamou até de quem arrasta as sandálias e se queixou de estar sozinha no mercado sem ter com quem debochar da nossa gente.
Confesso que toda vez que surge uma demonstração de intolerância, de xenofobia, me causa espanto.
Outro dia estava o país inteiro comovido com a discriminação que Juliette sofreu no BBB porque falava assim com nosso jeito paraibano. Bom, a história de Juliette foi que nem conto de fadas. A mocinha menosprezada e perseguida venceu o programa, engatou uma carreira de sucesso e os vilões … bem ninguém sabe deles.
Enquadrar a xenofobia como crime é um fenômeno recente. Desde 1997, quem discrimina etnia, religião e procedência nacional tem punição semelhante ao racismo.
Para mudar uma cultura, demora. Deve ser por isso, pela ausência de punição concreta, que muita gente acha que pode cometer o que se chama de “xenofobia recreativa”, que é discriminar alguém por sua origem por “diversão”, a pretexto de fazer uma brincadeira. Foi assim que Adriana se comportou e foi assim que Léo tratou o que houve. Fazendo de conta que era apenas uma piada e que nós não deveríamos nos incomodar com isso.
Felizmente, a lei mudou e o comportamento dos brasileiros precisa se renovar também.
O sotaque paraibano ou nordestino de uma maneira geral sempre foi alvo de reprimenda.
Algumas décadas atrás, nos telejornais, só o saudoso Geneton Moraes Neto e o grande Francisco José ousavammanter sua forma nordestina de falar. Nas faculdades, estúdios de TV ou rádio recomendavam que escondêssemos nosso sotaque a pretexto de que jornalista ou radialista bom teria que ter uma forma neutra de falar.
Balela. Isso só valia para a nordestinidade. Os cariocas, paulistas, gaúchos mantinham suas identidades orais.
Hoje, já temos novelas em que os personagens não são caricaturas de nordestinos, mas pessoas reais. Existe lei para punir quem debocha de uma das expressões mais legítimas da nossa cultura: a forma de falar. Jornalistas e radialistas já não precisam fingir que não são nordestinos.
Os tempos mudaram. Nas décadas de 70 e 80, muitos de nós deixavam o Nordeste para buscar emprego fora. Éramos mal tratados, chamados de paus de arara. Hoje, os sulistas como Adriana e Léo é que vem trabalhar aqui. Nós como bons anfitriões, os recebemos oferecendo mais que respeito: afeto.
É com a lei e com essa dignidade nordestina e paraibana que esperamos mudar os comportamentos. O sotaque nordestino é forte, como nosso povo. E toda vez que alguém demonstra incapacidade de reconhecer algo tão evidente, a paraibanidade toda se reúne, se renova e se insurge.
Para Adriana, que fez um pedido de desculpas acanhado, protocolar, caberia reconhecer verdadeiramente que não foi uma brincadeira, mas um erro grave contra todo um povo.