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Selecionada pela Natura para gravar disco, Bixarte revela “potência travesti”

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Iasmim Soares
Estagiária

Na última quinta-feira, 10, a artista paraibana Bixarte foi anunciada como um dos nomes que terão seus projetos apoiados pela iniciativa Natura Musical, que atua há 15 anos fomentando produções e artistas brasileiros. A trajetória da cantora, contudo, é anterior a esse reconhecimento.

Em 2018, a artista Bianca Manicongo expôs uma das suas primeiras poesias nas redes sociais, justo no dia em que a vereadora Marielle Franco foi assassinada. Os versos eram sobre o medo de ter a vida ceifada. O temor, contudo, foi dando lugar ao empoderamento. Bixarte, como ficou conhecida nessa época, dava ali o primeiro passo e está construindo história no cenário musical paraibano.

A cantora começou fazendo poesias nas redes sociais mas não demorou para suas palavras ganharem amplitude. Foi nos slams, eventos de rua que reúnem diversos poetas para recitar suas poesias faladas, seja em forma de competição ou não, que Bixarte encantou o público com suas palavras certeiras, ganhando visibilidade na cena da cultura Hip Hop da Paraíba. E não demorou muito para que o Brasil pudesse conhecer o seu trabalho, em disputas de slams nacionais. As poesias alcançaram voos mais longos e chegaram no seu primeiro EP ‘Revolução’. Mas, não parou por aí. Em seguida surgiu a mixtape ‘Faces’, em 2019. A artista começou 2020 com o videoclipe da composição ‘Yemanjá’, totalmente independente. Ao longo do ano outros projetos foram surgindo e, cada vez mais, seu protagonismo na cena cultural do estado.

Mulher preta, travesti, da periferia da cidade de Santa Rita (na grande João Pessoa), Bianca Manicongo enfrenta o CIStema (alusão ao sistema cisheteronormativo) de frente, sem medo de ser quem é. Não se cala, não aceita menos que o primeiro lugar. E foi em primeiro lugar que ficaram Bixarte e Fúria Negra, sua companheira de palco, na final do Festival da Música da Paraíba com a canção ‘Cê não faz’, no último domingo, 6. De acordo com a cantora, esse ano foi cheio de batalhas e conquistas. “O ano de 2020 foi um ano de vários atravessamentos ao meu corpo. Começamos sem ter um Real para investir no clipe da música ‘Yemanjá’. Eu acredito que esse ano foi regido pela força travesti. Apesar de todos os atravessamentos, nesse fim de ano vejo várias das minhas tendo seus objetivos concretizados”, ressaltou.

Na última quinta-feira, 10, veio o resultado da seleção pela Natura Musical que em 15 anos de atuação, investiu R$ 159 milhões em 467 projetos patrocinados, com mais de 1500 produtos culturais lançados, impactando 1,8 milhão de pessoas diretamente. O projeto selecionado de Bixarte é um álbum que será dividido em duas partes: a primeira vai ser viabilizada pela lei Aldir Blanc e a segunda, pela Natura Cultural. O público pode esperar em ambos uma nova estética, é o que conta Bixarte: “Eu comecei a escrever essas músicas para o novo projeto há sete meses. Elas vêm pautadas no que a branquitude diz que é belo, inclusive padrões, figurinos, tecidos. Tudo aquilo que eles dizem que é deles vai ser nosso por direito. Estamos construindo essa estética para ressignificar o que é música, ressignificar o que é travesti.”.

Iniciativas que incentivam a cultura são muito importantes para que pessoas como Bianca possam ganhar espaço em um cena cultural tão elitista e embranquecida como é a brasileira. “Para entregarmos um trabalho com excelência, precisamos desses espaços que são negados para nós. Então quando a gente vê travesti sendo selecionada para Lei Aldir Blanc, Casa Natura, e todos os espaços que estamos conseguindo entrar, começamos a entender qual é a nossa missão aqui na Terra e principalmente em João Pessoa que é uma capital coronelista, racista, transfóbica e classista. Acaba que eles vão ficando encurralados com a gente entrando nos espaços deles”, explicou.

Violência transfóbica – De acordo com o Dossiê dos assassinatos e da violência contra travestis e transexuais no Brasil em 2018, disponibilizado pela Associação Nacional de Travestis e Transsexuais do Brasil (ANTRA), das 163 pessoas assassinadas, 82% eram negras. Transsexuais e travestis negras são as mais afetadas pelas desigualdades tanto de classe quanto de gênero e raça no Brasil. Infelizmente, os ataques transfóbicos são vividos cotidianamente por pessoas travestis e transsexuai e Bianca não ffoi exceção. Apesar disso, ela afirma a importância da sua arte acima das violências às quais está sujeita. “Há uns 10 dias, levei uma pedrada quando ia para a Universidade Federal da Paraíba. Neste dia, a minha assessoria de imprensa recebeu inúmeros contatos de jornais e blogs querendo noticiar que eu tinha sofrido transfobia. E quatro, cinco meses antes da pedrada, eu tinha mandado para esses mesmos portais [a informação] que eu ia lançar o clipe de ‘Assiste o meu sucesso’ e pouquíssimos noticiaram. Foi nesse dia que eu resolvi que eles não iam noticiar a violência contra o meu corpo. Se não for para noticiar o meu trabalho, eles não vão falar sobre mim”, desabafa.

O lugar que a sociedade transfóbica reserva às travestis atualmente é cercado por estereótipos e imagens de violência, mas artistas como a Bixarte atuam na desconstrução desses rótulos preconceituosos. “A gente é acostumada a ver travesti como ladra, como prostituta, como diversas coisas. Mas a gente nunca vê travesti como potência, então eu acredito que o que nós estamos construindo na Paraíba se chama história. Porque estamos começando a mostrar para as pessoas paraibanas, que nós travestis, bichas pretas, gordas que temos potência, temos talento, temos afinação, temos força de vontade, e acima de tudo temos vida. Precisamos que falem de nós enquanto estamos vivas”, afirma.

Parafraseando uma de suas músicas, vão ter que assistir o sucesso de Bixarte. A carreira da artista está apenas no começo. Muitas conquistas virão. Mas, um recado precisa ficar bem nítido: “Eu não quero ser uma referência morta. Eu quero que as pessoas me referenciem viva”, pontuou a cantora. Artistas travestis e transsexuais resistem. Viva Bixarte!

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