A PEC (proposta de emenda à Constituição) que permite a comercialização de plasma para desenvolvimento de novas tecnologias traz risco de desabastecimento dos bancos de sangue do país e de fragilização do controle dos materiais que são coletados, afirma o senador Humberto Costa (PT-PE).
O texto, de autoria do senador Nelsinho Trad (PSD-MS), permite que a iniciativa privada faça pesquisas e desenvolva tratamentos a partir do plasma.
A justificativa é evitar o desperdício. Ele cita dados de 2017 que indicam perda de 597.975 litros de plasma, segundo TCU (Tribunal de Contas da União) e Ministério Público.
No final de agosto, a senadora Daniella Ribeiro (PSD-PB), relatora do texto na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), alterou a redação para deixar explícita a autorização para comercialização do plasma para fins de uso laboratorial, desenvolvimento de novas tecnologias e de produção de medicamentos hemoderivados destinados a prover preferencialmente o SUS (Sistema Único de Saúde).
Para Costa, há um “interesse econômico grande” por trás da PEC. No Brasil, a estatal Hemobrás recolhe o plasma que não é usado em transfusões de sangue, trata o produto e envia para o fracionamento no exterior.
A empresa recebe os medicamentos de volta, como a imunoglobulina, e distribui para atender parte da demanda da rede pública. A partir de 2025 todas as etapas seriam feitas no Brasil, assim que terminarem as obras da fábrica da estatal em Goiana (PE).
“Hoje, no mundo, seja por conta da guerra da Ucrânia, seja pelo que a gente vivenciou na pandemia, nós temos um déficit de plasma para a produção, especialmente de imunoglobulina”, diz.
“E com essa falta de imunoglobulina em termos mundiais e falta de plasma, o que é que eles querem? Eles querem pegar do Brasil. Pelo tanto de doença que a nossa população é exposta, a nossa imunoglobulina é boa. Então, a resposta imunológica é maior. Querem pegar o plasma do Brasil, do povo brasileiro, e usar para fazer hemoderivado e vender por aí afora.”
Ele vê riscos caso a PEC seja aprovada. “Tranquilamente eles vão aprovar a coleta remunerada. O que vai acontecer? Quem doa hoje voluntariamente vai continuar doando voluntariamente com o mesmo interesse se alguém está pagando pelo plasma? A tendência é que a gente perca sangue”, diz. “Aí pode esvaziar os bancos de sangue públicos.”
O senador lembra ainda que o material coletado é analisado pelo Sistema Nacional de Sangue, Componentes e Derivados. Antes da doação, o voluntário precisa responder a um questionário com perguntas pessoais. Para Costa, quem quer vender o plasma pode mentir para não perder a remuneração dada em troca da doação.
Folha Online