Neste fim de semana, assisti à série documental Pacto Brutal: O Assassinato de Daniella Perez. São cinco capítulos em que é contada toda a trajetória do crime. Apesar de ter sido lançada em julho, a morte do assassino Guilherme de Pádua em novembro reacendeu o interesse do público pelo caso e, consequentemente, pelo documentário que está disponível numa plataforma de streaming.
Um fato que tem relação com a Paraíba me chamou a atenção porque passou despercebido da minha memória, embora eu tenha acompanhado a repercussão desse crime bárbaro na época em que ele foi cometido.
Um paraibano, o senador Humberto Lucena, foi fundamental para que a dramaturga Glória Perez, mãe de Daniella, conseguisse mudar as leis brasileiras para punir com mais rigor os homicídios qualificados.
A morte de Daniella se deu em um homicídio qualificado porque foi praticado de forma cruel e também premeditada e que incluiu uma emboscada que começou num posto de gasolina perto do estúdio onde a atriza gravava as cenas da novela de Corpo e Alma, da qual era protagonista.
Glória ficou revoltada porque menos de 48 horas depois de ter assassinado Daniella, Guilherme de Pádua foi solto através de um habeas-corpus. De acordo com a legislação da época, os assassinos tinham direito de esperar, em liberdade, por um julgamento que podia ser adiado indefinidamente – bastava ter bons advogados, que soubessem explorar as brechas da leis e utilizar o recursos para atrasar o andamento do processo.
A mãe de Daniella começou então uma grande mobilização popular para mudar essa lei e para incluir entre os crimes hediondos o homicídio qualificado. Assim, para esse tipo de criminoso, a prisão passaria a ser imediata e não se admitiria o pagamento de fiança.
Glória iniciou o que seria a primeira emenda popular da História do Brasil e com ajuda de muitos artistas reuniu mais de um milhão de assinaturas pedindo a modificação na lei de crimes hediondos. Quando ela e um grupo de atores chegou ao Congresso com as caixas contendo as assinaturas em outubro de 1993, já era o último dia para apresentar e votar a emenda. Glória viu então muitos senadores saindo para não votar o texto. Mas, ela própria lembra no documentário que foi graças ao paraibano Humberto Lucena, então presidente do Senado, que o esforço todo não foi em vão. Ele lançou mão do recurso de urgência urgentíssima e fez passar o projeto.
Não havia quorum, porque parte dos senadores já havia viajado, Humberto Lucena fez uma votação simbólica. Assim, às vésperas do recesso, já à noite, a ampliação da Lei de Crimes Hediondos foi aprovada e enviada para a sanção presidencial.
Além de Humberto, outro paraibano, o deputado José Luiz Clerot (PMDB-PB) foi importante para a mudança na lei. Ele havia sido o relator do projeto na Câmara.
A nova lei não poderia ser usada contra Guilherme de Pádua e Paula Thomaz porque a lei não retroage para prejudicar. Mas, o propósito de Glória era o de fazer com que outras mães não sofressem ainda mais com a impunidade dos algozes de seus filhos e filhas.
A série é muitíssimo interessante. Para quem não viveu aqueles dias e acompanhou o noticiário, pode ser difícil acreditar que a morte de Daniella, da maneira como foi, seja um fato real. Um colega de profissão, que fazia com ela um par romântico na trama, engendrou uma armadilha para matar a moça em meio ao que pode ter sido um ritual maligno (há vários indícios disso). O mais criativo autor de thrillers poderia parecer fantasioso. Mas, a realidade superou todas as piores expectativas e a punição aos dois homicidas só se deu pela obstinação de uma mãe, contra inúmeras barreiras ela pensou em diminuir a dor de outras mães e pais. Como artista, Glória é incrível, mas como ser humano, é incomparável!