Depois de selar o acordo entre a União Europeia e o Mercosul, no fim de junho, o Brasil voltou ao centro das atenções do mundo ao longo das últimas semanas. Não pela abertura de novos mercados ou tratados de livre-comércio, mas pelas declarações do presidente Jair Bolsonaro e polêmicas envolvendo o governo, como a provável indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) à embaixada brasileira nos Estados Unidos, em Washington. O discurso da radicalização, em uma postura de confronto com países como Argentina, Alemanha e Noruega, causa preocupações aos que temem pela “nova direção”, como define Bolsonaro, e incertezas, mesmo entre aliados.
O Correio ouviu especialistas, parlamentares com afinidade a outros países e investidores estrangeiros, e a conclusão é de que o mundo observa, sim, o Brasil com outros olhos. Representantes de países asiáticos, como Japão e China, e integrantes do Brics, Rússia, Índia e África do Sul, não demonstram muito incômodo com a postura do Executivo. Os principais focos de insatisfação em relação ao governo brasileiro estão na Europa Ocidental. “Há uma preocupação de que o Brasil tenha ultrapassado uma linha do razoável por conta de Bolsonaro. Ele passa um ar de soberba e arrogância. Não é bom, mas não é o fim dos tempos”, pondera um investidor europeu.
O próprio presidente defende o contrário. Na sexta-feira, sustentou que é sempre consultado por ministros e concorda em grande parte com as sugestões, embora tenha deixado claro que ele tem a palavra final. “Tenho poder de veto, se não vou ser um banana, ok? O povo não acreditou em mim? Então, a política é minha. Não é autoritarismo, mas hierarquia e disciplina. Tem que ter”, destacou. Apesar do que o presidente diz, a leitura do mundo sobre o Brasil piorou depois de ele sugerir, na última quinta-feira, que a Alemanha e Noruega, que suspenderam, juntas, cerca de R$ 285 milhões para o Fundo Amazônia — em resposta ao avanço do desmatamento na região —, usem as verbas para reflorestamento de suas matas nativas.
Na Argentina, onde Bolsonaro iniciou uma nítida campanha contra o vencedor das primárias nas eleições presidenciais, Alberto Fernández, o Brasil também passou a ser visto de outra forma: um populismo de direita. Mesmo nos Estados Unidos, onde Bolsonaro construiu um bom relacionamento com o presidente norte-americano, Donald Trump, democratas e a ala menos radical entre os republicanos observam a proximidade entre os países com um pé atrás.
Publicações estrangeiras têm feito críticas ao presidente. O RFI, da França, trouxe que “Bolsonaro é incapaz de construir discurso coerente”. O The Economist, da Inglaterra, aponta que “o desmatamento na Amazônia pode em breve começar a se retro desmatar”. No El País, da Espanha, o chefe do Executivo é o “novo vilão do mundo”
Mercosul
Não é toda a Europa que faz algum juízo de valor negativo do país. Mesmo na região Ocidental, a Itália e a Inglaterra, ambas sob influência ou comando de membros da direita conservadora, veem o Brasil bem posicionado na geopolítica. No Leste Europeu, o país é bem cotado por nações como Hungria e Polônia. No entanto, em um contexto macro, a preocupação é pela possibilidade de as declarações e ações de Bolsonaro colocarem em risco acordos internacionais, como o entre a União Europeia e o Mercosul.
O presidente refuta essa possibilidade. “Não vai atrapalhar (sobre os posicionamentos em relação à Argentina). Demorou muito, pois tinham mais três países (Argentina, Uruguai, Paraguai). Se fosse só o Brasil, já tinha resolvido, até de forma multilateral”, respondeu, na sexta-feira. Bolsonaro retrucou ainda a possibilidade de uma imagem desgastada do país no exterior.
“A imagem péssima que (o Brasil) tinha era de subserviência a essas potências (Alemanha e Noruega). Eles não estão de olho na Floresta Amazônia. Eles querem a sua soberania e sua riqueza. Nós, a Amazônia, temos coisas que os outros países não têm mais. Fico surpreso de ver a (chanceler alemã) Angela Merkel anunciando isso (suspensão de recursos), como se o país dela fosse algum exemplo para o mundo na questão da preservação ambiental”, declarou, na quinta-feira.
Correio Braziliense