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A Senhora do Lado

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Uma vez a minha mãe adoeceu de febre reumática. Meu pai estava viajando a trabalho, penso que no Rio Grande do Sul e éramos apenas ela, meus irmãos e eu.

Naquela manhã, não conseguiu levantar da cama, sentindo muitas dores.

Ainda não existiam telefones celulares, a comunicação era complicada, então meu pai não sabia o que estava acontecendo.

A primeira vizinha, que percebeu algo diferente no movimento matinal rotineiro, bateu na nossa porta.

As casas tinham muros baixos, não existiam grades e durante o dia, deixar portas e janelas abertas não representava nenhum risco.

Pela manhã, depois de preparar o café e mandar os filhos para a escola, as mulheres talvez fossem regar as plantas do jardim e prosear um pouco.

Dona Mariana entrou preocupada. Logo que viu minha mãe, correu à procura de Doutor Canejo, clínico geral, também vizinho e padrinho da minha irmã.

Com a sua maleta preta, cheia de instrumentos prateados, bigode grisalho e ar sério,
estava sempre a postos e atendia seus pacientes em casa.

Lembro bem dele. Louco por pássaros, tinha um viveiro gigante, onde gostava de ficar parado, parecendo um espantalho, enquanto eles iam pousando nos seus braços, ombros, cabeça. Era um espetáculo assistir àquela cena.

Dona Mariana e ele conversaram coisas que não entendi direito, mas vi que era sério.

Febre, repouso, reumatismo…

– O marido ainda demora viajando?

– Quem vai cuidar desses meninos?

A essa altura mais vizinhas já estavam lá em casa.

De repente uma delas nos empurra para o banheiro:

– esses meninos tem que ir pra escola. Enquanto outra na cozinha:

– mas eles não comeram nada ainda…

Pois bem, naqueles dias, minha mãe de cama, a vizinhança tomou conta da gente.

Uma chegava logo cedo, preparava o café da manhã e cuidava que a gente fosse limpinho pra escola.

Doutor Canejo fazia a visita do dia, dava as recomendações médicas e deixava umas balinhas de coco coloridas, tão doces que dava uma dorzinha na mandíbula.

Uma ficava em casa com minha mãe e minha irmã, até que a gente chegasse e outra preparava o almoço.

De noite, dona Adelaide, que era a diretora da escola e tocava piano, chegava trazendo sopa, pães fresquinhos e só saía quando todos estavam devidamente alimentados e acomodados para descansar.

Eu ficava encarregado de dormir no quarto da minha mãe, para pedir ajuda se algo acontecesse.

Não fosse a movimentação incomum dos vizinhos pela casa, mamãe de cama no quarto e a falta dos seus alunos na grande mesa colocada no fundo do terraço, onde dava aulas de reforço (Uma farra nos nos fins de tarde! Foi nessa mesa que aprendi a ler e amar os livros), a vida seguiu seu rumo.
A casa manteve-se em ordem, tivemos todas as refeições e não faltamos sequer um dia de aula.
E o mais importante: não tivemos medo. Ninguém deixou a gente ter medo.

Nós confiávamos naquelas pessoas. E elas estavam ali, tranquilas, discretas, afetuosas, até mesmo mandonas, sabendo do direito de ser autoritárias com as crianças, e que aquilo era cuidado.

Isso era feito como se não fosse peso algum.

À tarde os amigos da rua nos chamavam pra brincar e a gente ia. Se brincássemos em casa, alguém pedia pra gente não fazer muito barulho.

E tudo correu bem.

Quando meu pai chegou de viagem, minha mãe já se recuperava.

Lembro das vizinhas respondendo aos seus agradecimentos:

– Não foi nada!

– Não fiz mais que minha obrigação…

– Qué isso, rapaz! Se fosse comigo ela tinha feito a mesma coisa!

E tinha mesmo.

Naquele tempo, a gente brincava na calçada, doutor Canejo podia ter pássaros no viveiro, eram as mulheres quem tinham de cuidar da casa, privacidade quase não existia, a programação da televisão começava tarde e terminava cedo.

Mas a gente não tinha medo de gente.

Todo mundo cuidava de todo mundo e isso era simples e natural.

É claro que prefiro pássaros fora de gaiolas e sei que lugar de mulher é onde ela bem entender.

Gosto de privacidade e de ter TV, Internet, o que for, 24 horas por dia.

Mas será que não dava pra ter também aquela sensação de confiança, de amparo e segurança nas outras pessoas?

Ai que saudades de dona Mariana, de doutor Canejo e de dona Adelaide!

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