Joaquim Leite, o ministro do Meio Ambiente, fez um discurso agressivo e atrapalhado na COP27, na plenária de Sharm el-Sheikh em sua rodada ministerial. O presidente Jair Bolsonaro, derrotado nas eleições de outubro, não participará do encontro. Já o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, desembarcou no Egito para a COP27 na madrugada desta terça-feira, e se encontrará com o enviado americano do clima, John Kerry, no fim do dia.
— Filantropos, líderes e empresários e seu sempre exagerado número de assessores vieram em jatos particulares ao luxuoso balneário do Mar Vermelho para cobrar metas de redução de emissões dos outros, sugerindo carros ultramodernos a hidrogênio ou 100% elétricos, completamente desconexos da realidade de diversas regiões do Brasil e do mundo — disse Leite.
O problema é que o Brasil registrou 570 pessoas em sua delegação oficial, o segundo maior número em Sharm El-Sheikh, superando até a delegação dos anfitriões egípcios. Na lista brasileira há esposas e primeiras-damas de governadores e assessoras de primeiras damas do Pará, do Amazonas e de Mato Grosso, segundo levantamento feito pela Folha de S.Paulo.
Representantes de ONGs ambientalistas, indígenas, pesquisadores e de movimentos sociais estão fora da lista desde o início do governo Bolsonaro e costumam fazer seu credenciamento diretamente na ONU ou convidados por outros países.
Na fala confusa, Leite cobrou financiamento dos governos, mas na esfera do setor privado.
— Os governos têm a responsabilidade de atuar nesta agenda com racionalidade e sem discursos populistas e utópicos. Um bom exemplo é o financiamento para renovação de frotas de caminhões, carros, tratores e embarcações — disse o ministro. — No Brasil, temos mais de 900 mil caminhões com mais de 25 anos.
Financiar a renovação de frotas de outros países nunca esteve na mesa das rodadas climáticas nem fora delas.
O ministro também voltou a cobrar que os países desenvolvidos cumpram seus compromissos de financiamento.
— Vamos continuar recordando o compromisso dos países ricos em financiar com volumes relevantes e de forma eficiente os países em desenvolvimento para implementação de ações de mitigação, adaptação e compensações por perdas e danos.
Neste ponto, Leite tem razão: os países desenvolvidos ainda não cumpriram a meta prometida em 2009 e confirmada em 2015 de mobilizar US$ 100 bilhões ao ano para países em desenvolvimento. O volume de recursos está em US$ 83 bilhões, segundo a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
— Diferente dos governos anteriores, onde o foco era enviar recursos somente para ONGs, nos últimos anos implementamos políticas junto com o setor privado para dar escala a uma nova economia verde com objetivo de neutralidade climática até 2050 — disse ainda o ministro.
Leite não disse que as taxas de desmatamento da Amazônia, nos quatro anos de governo Bolsonaro, são crescentes ano a ano e em níveis muito altos. O número mais recente, do Prodes/Inpe, deve ser conhecido logo depois do término da conferência do Egito.
Ele ainda mencionou o “mercado regulado de carbono com elementos inovadores na formação de instrumentos econômicos que possibilitam a monetização dos ativos ambientais”. Leite não deixou claro que o que existe no Brasil hoje é apenas o mercado voluntário de créditos de carbono.
O ministro começou sua fala dizendo que o “Brasil ainda tem enormes desafios ambientais a superar”, e listou “o desmatamento ilegal na Amazônia, os 100 milhões de brasileiros sem acesso a rede de esgoto e 35 milhões (sem) água potável, e ainda mais de 2.600 lixões a céu aberto”. Essa é parte da tragédia socioambiental que o novo governo irá herdar.
O Globo Online