Notícias de João Pessoa, paraíba, Brasil

‘Calvário’: no jornalismo, é exigida a imparcialidade, no documentário, a ética 

Facebook
Twitter
WhatsApp
Telegram

O título desta coluna é uma resposta a um comentário de um suposto blogueiro paraibano sobre a minha parcialidade no documentário ‘Calvário’ (2021), dirigido por mim e lançado presencialmente nessa quinta-feira, 25, e agora disponibilizado no canal de Márcia Lucena no YouTube. A parcialidade revela-se na minha simpatia pela personagem, minha cunhada, e empatia por seu sofrimento na luta por justiça na Operação Calvário, reconhecida como um braço da Lava-Jato por seu modus operandi.

Esteticamente falando, não se espera imparcialidade na abordagem documental de um determinado aspecto ou evento da realidade e seus personagens. A narrativa documental, como qualquer outra, inclusive o jornalismo, é um construto por onde perpassa o viés da subjetividade. A diferença fundamental é que na ética do jornalismo espera-se o máximo  grau de imparcialidade possível. Reconhecemos, todavia, que é algo difícil de se atingir em sua plenitude. Mas também enxergamos que todos os esforços devem ser agenciados para este fim. Por sua vez, do documentário espera-se que seja ético em relação aos seus personagens, atores sociais e históricos.

Já escrevi um artigo acadêmico sobre o assunto que foi publicado na Aniki, Revista Portuguesa da Imagem em Movimento, em 2016, de onde transfiro algumas ideias para cá. O conceito de documentário é um chão movediço e controverso que tem mobilizado realizadores e teóricos do cinema ao longo das últimas décadas. O teórico Fernão Ramos constata uma tendência entre os cineastas contemporâneos de embaralhar as fronteiras entre os gêneros documental e ficcional como uma forma de afirmação de uma inventividade e ruptura ao negar normas consolidadas num domínio considerado tradicional.

Desta forma, estabelece-se um vale-tudo no campo da representação documental onde a estética se sobrepõe à ética, liberando o realizador, no momento de indexar sua obra, de qualquer compromisso com o espectador, que fica à mercê de frequentes logros e sem um referencial confiável para a fruição da narrativa apresentada. No documentário ‘Calvário’, atendi ao convite da personagem Márcia Lucena, presa em dezembro de 2019 e monitorada desde fevereiro de 2020, para registrar o sofrimento infligido a ela, injustamente, pelas ações da “Operação Calvário”. 

O documentário dá voz plena à personagem para narrar a sua saga. O modo de representação adotado pelo autor/diretor é o da participação. A personagem Márcia fala para a câmera ao longo de quase todo o percurso da narrativa. Esse modo de abordagem se tornou a tônica dos documentários produzidos a partir dos anos 1960 com a captação sincrônica de som e imagem, inaugurada pelo grupo do cinéma vérité (depois chamado de cinéma direct) capitaneado por Jean Rouch. É a ética do encontro onde a palavra é facultada aos personagens do documentário.

‘Calvário’ tem o depoimento de Márcia Lucena como condutor de sua narrativa e segue a ordem cronológica dos acontecimentos que a envolveram de forma inesperada. Nenhuma pergunta foi necessária pelo diretor. A curiosidade do espectador é a de atentar para o evento seguinte a ser narrado e chegar ao desfecho da história. Cabe ao público estabelecer uma certa empatia com a protagonista. Sua fala tem muito de factual no sentido de que o que ela diz pode ser verificado. No entanto, como em qualquer relato, sobretudo o de uma história pessoal vivida quase em simultaneidade com as filmagens tem sua carga de subjetividade.

A tônica na subjetividade também faz parte da narrativa documental não só nos documentários autobiográficos, aqueles onde o diretor narra sua própria história envolvendo relados do passado, embrumados pela memória, e também do presente. Em ‘Calvário’ optamos por entremear o relato de Márcia com suas poesias recitadas por ela tendo como trilha sonora a composição ‘Le monde des brutes’ (que coincidência, ‘o mundo dos brutos’) composta pelo franco-paraibano Didier Guigue, muito antes da ideia do filme, e doada gentilmente pelo autor.

Como uma ação entre amigos, a fotografia, montagem e finalização do documentário teve o engajamento de Rodrigo Barbosa, graduado em publicidade e se iniciando na linguagem documental. A concepção foi a de representar esses momentos sombrios da vida da personagem com cenas de chuvas e de um mar nublado em contraponto ao seu cotidiano com a família (Nanego e João, companheiro e filho apenas, pois Flora sua filha vive no exterior) com momentos de descontração e ócio criativo.  Entendemos que, com esta ação, estamos cumprindo a missão se engajar nessa luta pela liberdade de Márcia. 

Tags

Leia tudo sobre o tema e siga

MAIS LIDAS

Morre em João Pessoa o empresário Manoel Bezerra, dono das pousadas Bandeirantes

Juiz determina continuidade do concurso de Bayeux, suspenso desde 2021

STJ determina que plano de saúde não é obrigado a fornecer canabidiol

Anteriores

fp1 (1)

Curtas paraibanos revisitados em duas mostras no Brasil e Estados Unidos

unimedjp_compressed

ALPB discute falta de atendimento de planos de saúde a autistas nesta terça

ruyeppedro

Pedro garante apoio a Ruy e diz que João Pessoa precisa mudar de prefeit

georgesobrado

Presidente da Famup George Coelho será candidato a prefeito de Sobrado pelo PSB

Dinheiro

Prefeitura de Cabedelo oferece isenção de IPTU e ITBI a famílias com imóveis do Minha Casa, Minha Vida

curraldecima (1) (1)

Prefeitura de Curral de Cima nega irregularidades e diz que denúncias são de 2021

daniellacaixa (1)

Com empenho de Daniella Ribeiro, João Pessoa ganha mais uma agência da Caixa

poetasdesusa

Poetas de Sousa lançam coletânea de poesias

Oswaldo. Montenegro (2) (1)

Oswaldo Montenegro faz show com orquestra nesta sexta no Teatro Pedra do Reino

psb1

Candidatos à reeleição, prefeitos de Tavares e São Domingos se filiam ao PSB