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A difícil arte de mensurar os danos morais

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Muitas vezes ouvimos corriqueiramente em sessões de julgamento, a seguinte frase: “A partir de agora, as indenizações por danos morais terão os valores majorados”. Tal visão não me causa tanta surpresa, pois também tive a oportunidade de ver e ouvir como alguns magistrados chegam a um valor nominal para fixação de indenização por danos morais, através de um simples tabela, donde tem como marco a temperatura e humor daquele dia. Num turbilhão de sentimentos, os quais devem passar a margem do processo judicial, justificam, as vezes, a fixação com visões simplistas e a fórmula mágica que me conduzem as crônicas de Berilo Neves e sua preciosa obra “Cimento Armado”, Ed. A Noite, Rio de Janeiro, p. 64/72, que conta a história da norte-americana Sra. Read, que moveu uma ação indenizatória contra a atriz Clara Windsor, a quem acusou de ter roubado seu marido.

A questão se passou nos anos 50 (como também a obra de Berilo) e pôs em foco uma questão tão atual e quase tão velha como o mundo: Quanto vale um homem? Diz Berilo: “A verdade é que um homem, como um boi, ou a zebra, ou um par de tamancos, ou um cacho de bananas, ou qualquer outra mercadoria (fruta, animal ou objeto de uso) não possui valor intrínseco: Vale consoante as circunstâncias que o cercam, o lugar que se encontra e o mérito, ou demérito, que se lhe atribuem. Um homem bonito, moço e forte, no meio de mil outros homens igualmente moços, fortes e bonitos – vale pouco ou quase nada. Um homem feio e barbado e sujo, num país ou lugar onde não haja outros homens – nem barbados nem com a barba feita – vale uma catedral de mármore, um navio de guerra ou 20 jumentos carregados de jóias…”.

Voltando a perda do marido pela Sra. Read para a atriz Clara Windsor, afirma o autor: “Ora, o marido é, afinal de contas um homem como outro qualquer. Se a mulher gosta dele, o marido é um animal precioso; se não gosta, é um estafermo. O ouro é a única mercadoria que vale por si mesma. Um pedaço de ouro – seja uma pepita arrancada da terra, ou uma moeda arrancada do erário – é, sempre, um pedaço de ouro, e o ouro é o que o ouro vale. Já o mesmo não acontece aos abacaxis – que vale muito numa cidade onde rareiam esses frutos, e nada num campo onde toda gente os tenha… O destino dos homens tem, a esse aspecto, certa semelhança com o destino dos abacaxis…” De forma inteligente e lúcida, o autor arremata: “Enquanto isso, os químicos (que tudo pesam, esmiúçam, e medem), já provaram que o homem, complexo de ossos, músculos, cartilagens e tecidos diversos, não vale mais que Cr$ 10,70. Esse é, pelo menos, o custo exato do ferro, fósforo, sais minerais e substâncias outras que o compõem, em última e definitiva análise.”

A quantificação monetária feita por Berilo, evidentemente, é consentânea a época dos fatos. Mais adiante, numa análise didática/financeira sustenta: “Do ponto de vista químico, Pascal valia tanto quanto o mais obtuso sapateiro da França”. “O sujeito mais presumido do mundo, à luz da Ciência não chega a valer Cr$ 11,00! Mussolini – um homem de gênio – posto numa cuba de alumínio, e reduzido à expressão mais simples, não dá para comprar um chapéu de palha! É horrível, para quem possui 20 milhões de cruzeiros, saber que a sua carcaça, despojada da roupa, dos preconceitos e de amor próprio, vale tanto quanto um par de meias de fio da Escócia!” Berilo, em seu genial raciocínio também traça os seguintes valores: “O nosso Rui Barbosa não daria um par de meias de seda, para senhora – que custa Cr$ 70,00, segundo dizem os meus amigos casados…”.

E isso assim é na hipótese de que o indivíduo seja comparado a peso: reduzido as cinzas, e posto numa caixa de papelão (dessas em que se compra bicarbonato de sódio), não dá para comprar uma caixa de fósforos! Ainda traçando um paralelo, entre homens, animais com os valores monetários à época, vai mais adiante: “Mas, se o homem, rei da Criação (pelo menos é ele quem o diz…) vale menos de Cr$ 11,00, um burro deveria valer um níquel de 40 centavos e, entretanto, vale Cr$ 60,00, e um bode mal educado dá Cr$ 30,00 ou 40,00 e, uma vaca (que nunca se diplomou em Direito) dá Cr$ 150,00 ou 200,00, conforme seja, ou não, boa leiteira…”.

Para não mais me alongar, cito parte da conclusão que chega Berilo: “Qualquer porco sujo, de chiqueiro, vale mais, do ponto de vista econômico, do que muito poeta inspirado que anda por aí, à cata de emprego, de rimas e de uma boa esfregadela com sabão… O nosso orgulho, de reis da Criação, não nos permite dizer isso, mas tal é a expressão fria da Verdade. Um canário belga vale Cr$ 500,00 – cinqüenta vezes mais, portanto, de que um engenheiro ou um homem de letras. Um peru gordo vale Cr$ 50,00. Uma galinha, absolutamente estúpida, que, em matéria de ginástica, só sabe ciscar e, em matéria de arte, não vai além do cacarejo, pode dar Cr$ 20,00, numa feira livre! – isto é, tanto quanto o Homem, animal sonhador, que fez a Metafísica, construiu a Enciclopédia e levantou as pirâmides do Egito… Um cachorro, um simples cachorro – incapaz de ler um letreiro em inglês, ou de repetir um trecho da “Divina Dama” – dá, com uma fita no pescoço e o pelo bem limpo, 2 ou 3 mil cruzeiros – isto é, o valor de 40 burros, 40 perus e 200 bacharéis! Como já afirmado, tais fatos e relatos se passaram nos anos 50, demonstrando que, ao completarmos quase sete décadas, ainda persistem os tormentos acerca da quantificação dos danos morais.

Vários são os direcionamentos e estudos acerca do tema, porém, pelo que me consta, nenhum civilista ousou a apontar um valor exato. Em resumo, embora sendo um tema por demais controvertido e suscetível a debates intermináveis, parece-me que frágeis soluções, e punições excessivas que são cultuados sem conhecer a efetiva estrutura de empresas elevam o debate jurídico ao nada. Semear o entendimento de que é preferível ter uma demanda judicial do que dar resolução uma demanda administrativa é desconhecer por inteiro o custo efetivo que uma empresa tem com o judiciário, advogados etc. Como afirmado, um tema caro, que ainda temos muito a aprender e por isso pergunto então: Se Berilo ainda vivo estivesse, quanto valeria a honra de um homem nos dias atuais?

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