Em 1603, William Shakespeare escreveu a tragédia Otelo. Relevante até hoje, a obra trata de racismo, amor, ciúme e traição. Mas também traz, em um diálogo entre o suboficial Iago e o tenente Cássio, um tema que muito interessa aos comunicadores: reputação. “Reputação, reputação, reputação! Oh! perdi a reputação, perdi a parte imortal de mim próprio, só me tendo restado a bestial. Minha reputação, Iago; minha reputação!”, lamenta Cássio.
Aos que me imaginam culta e com memória fantástica para relembrar tal frase, esqueçam! Na verdade, resgatei essa referência do livro “O Poder da Reputação”, de John Whitfield, para quem “reputação é um subproduto da fofoca”. Ou seja, sempre vai depender do que os outros dizem às nossas costas. “A reputação é uma maneira que a sociedade tem para controlar os seus membros: nasce nas relações sociais e morre nas barreiras sociais”, acredita o autor.
“Nossas reputações, mesmo não sendo exatamente imortais, acabam sendo maiores que nós, exercendo influência positiva ou negativa sobre nossos interesses mesmo depois de nossa morte. Para Whitfield, o motivo pelo qual nossas reputações sobrevivem a nós mesmos é que elas não são parte de nós. “O fato é que nossas reputações não nos pertencem, e sim àqueles que nos conhecem ou que ouvem falar de nós. A informação que forma nossas reputações reside na mente das pessoas”, diz.
O conceito de reputação está relacionado à percepção da coletividade sobre pessoas, marcas, produtos, corporações. É ativo importante, moeda essencial e que precisa de atenção redobrada. Crises representam uma ameaça à reputação. E nada adianta investir em campanhas mercadológicas caras ou ações diversas de marketing se a reputação de uma empresa ou organização vive abalada por fatos negativos. Foi o que aprendi com o mestre João José Forni no livro “Gestão de crises e comunicação”, obra de que gosto muito e sempre cito quando acho oportuno.
Conforme Forni, reputação é ativo difícil de mensurar e se constrói ao longo da vida, pela forma de agir dentro de princípios éticos. “Por que o consumidor decide comprar determinado produto, preterindo o concorrente? Vários fatores contribuem para essa decisão, mas seguramente a reputação da empresa, da marca e do produto é decisiva na hora”, afirma.
Se cuidar da reputação já era algo levado a sério pelas empresas, a crescente exposição de marcas e profissionais nas redes sociais aumentou tal entendimento. Ser relevante, aparecer, estar na mídia é anseio de muitos, mas também aumenta a visibilidade do alvo. Por isso, é necessário zelar pela reputação, principalmente porque a cultura do cancelamento virtual não poupa pessoas ou marcas.
Não por acaso, nos últimos anos, várias empresas brasileiras, a exemplo do Magazine Luíza e do Itaú Unibanco, começaram a investir na contratação de profissionais especializados em zelar e monitorar a reputação das empresas. Relativamente novo no mundo corporativo, o cargo de CRO (Chief Reputation Officer, na sigla em inglês) é responsável por gerenciar riscos, desenvolver e implementar estratégias de gerenciamento de reputação.
Sobre esse tema, a consultoria Deloitte Global revela que “reputação e risco de marca” estão entre os cinco pilares do risco empresarial. “A reputação afeta o valor da marca, a fidelidade do cliente, o sentimento do investidor e o valor. Se o capital reputacional não for gerenciado proativamente, ele pode ser rapidamente destruído”. Mais: a reputação em si, aponta a Deloitte, também deve ser gerenciada com investimentos adequados em recursos de monitoramento e comunicação. Não se constrói reputação num estalar de dedos bem como não se mantém tal ativo ignorando uma palavrinha simples e de efeitos complexos: confiança! Por isso, construir relacionamentos, manter uma reserva de confiança abundante e fazer a medição crítica das percepções dos “stakeholders” é essencial.