Dando continuidade à série de artigos publicados neste mês em homenagem ao 8 de março, Dia Internacional da Mulher, Iasmin Soares (produtora de conteúdo para as redes sociais, ativista, feminista interseccional, estudante de jornalismo e pesquisadora de afetividade e sexualidade de mulheres negras) aborda as facetas decoloniais do feminismo. No texto, ela busca descolonizar os pensamentos eurocêntricos. Confira:
Por facetas decoloniais do feminismo
Esta semana, trato de novas perspectivas de lutas das mulheres. Outras visões que não são eurocêntricas e liberais. Mas, para começar vou relembrar alguns conceitos que já trouxe aqui nesta coluna sobre mulheres e feminismo. Contei para vocês que a luta pelos direitos femininos vem de muito longe, não foi com o movimento das sufragistas que as mulheres começaram a questionar a estrutura patriarcal. Mulheres indígenas de diversos continentes lutaram junto do seu povo para barrar a colonização e para que os seus corpos não fossem violados pelos europeus colonizadores. A luta das mulheres não brancas, com deficiência, lésbicas, bissexuais, trans e pobres vem de muito longe.
Hoje resolvi trazer para vocês algumas vertentes do feminismo que são mais amplas. Essas vertentes são decoloniais, ou seja, que buscam descolonizar os pensamentos eurocêntricos e partem de uma perspectiva de pessoas não brancas.
A primeira delas é o feminismo interseccional. Mas o que é isso? Essa vertente foi criada oficialmente nos Estados Unidos. Em 1991, em uma pesquisa, a autora kimberlé Williams usou esse termo pela primeira vez. Para entender o feminismo interseccional vamos imaginar uma mulher, ela é negra, pobre e trans. Cada uma dessas categorias são ruas secundárias e a pessoa é a rua principal, e todas as ruas secundárias se cruzam na rua principal. Então, uma mulher negra, trans e pobre não pode ser só uma mulher trans. Ela é uma junção de todos esses fatores.
Para a interseccionalidade uma categoria de opressão não importa mais que a outra, todas são importantes e não devem ser tratadas individualmente. O feminismo interseccional precisa pensar a partir das margens para que as condições de vida sejam dignas para quem ocupa esse lugar e para todes da sociedade.
Outra vertente que nos últimos anos vem sendo pautada é o feminismo comunitário. Como o próprio nome sugere, é uma perspectiva de luta coletiva, construída por comunidades inteiras. Para a queda do patriarcado, não é só as mulheres que devem lutar, essa luta é de todes. O patriarcado é prejudicial para toda população e ele é contra os princípios de bem viver estabelecidos pelo feminismo comunitário.
Umas das feministas comunitárias mais conhecida é a Julieta Paredes, indígena de origem aimará, faz parte da Assembleia Feminista Comunitária de La Paz (Bolívia) e da organização Mulheres Criando Comunidade, que se definem como aquelas que em 1990, na Bolívia, sonharam com um feminismo que destruísse o patriarcado e construísse o Bem Viver para as mulheres e homens do seu povo. O feminismo comunitário é construído nas ruas, aldeias, favelas, sítios e em todo lugar que haja organização de comunidades para o bem estar e a derrubada do patriarcado e do colonialismo.
Uma terceira vertente que trago é o feminismo asiático. Aqui no Brasil esse tema ainda é pouco discutido, foi só em 2016 que surgiu o coletivo Lotus feminista, um dos primeiros a pautar o feminismo em uma perpectiva das mulheres asiaticas. O feminismo asiático pauta tanto mulheres marrons (indianas e do oriente médio), como mulheres amarelas ( japonesas, chinesas e coreanas), e discutem questões de gênero atreladas ao racismo. Umas das principais pautas é a erotização dessas mulheres e o preconceito etnico e racial.
Percebam que o feminismo é muito plural e abrange muitas pessoas. Se no passado mulheres não brancas não eram pautadas, hoje elas são protagonistas das suas próprias vertentes e lutas. Eu sou porque nós somos. A luta é coletiva e não individual, juntas e com pluralidade podemos muito mais.