Bertrand Lira

Bertrand Lira é cineasta e professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFPB/Campus I
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O Super-8 paraibano e seus filmes transgressores em mostra na Cinemateca Brasileira

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‘A onda de filmes Queer em Super-8 da Paraíba’ será um dos programas de uma ampla mostra que acontece de 19 a 28 deste mês na Cinemateca Brasileira de São Paulo. Com a exibição de seis filmes produzidos na Paraíba no início dos anos 1980 na bitola Super-8 com a temática queer. Estes curtas-metragens foram digitalizados em alta resolução graças ao projeto Iniciativa de Digitalização de Filmes Brasileiros (IDFB) de filmes de cineastas historicamente negligenciados. A Cinelimite é uma associação sem fins lucrativos, criada em 2020, que exibe pela primeira vez no Brasil toda a produção digitalizada nos últimos dois anos.

Compõem a mostra queer paraibana os curtas-metragens Closes (1982), de Pedro Nunes, Perequeté (1981), de Bertand Lira, Tá na rua (1981) e Era vermelho seu batom, de Henrique Magalhães, Baltazar da Lomba (1982), do grupo de ativismo gay Nós Também (composto por artistas, estudantes e professores universitários), e Miserere Nobis (1982), de Lauro Nascimento, professor e ativista do grupo. Esta mostra chegará a João Pessoa em junho próximo no Cine Banguê do Espaço Cultural e deverá circular pelos Estados Unidos, Europa, Ásia e América Latina, em festivais de cinema, cineclubes universitários e salas de cinemas de instituições.

A partir de Gadanho (1980), de Pedro Nunes e João de Lima, houve uma retomada do cinema na Paraíba porque vários pretendentes a cineastas perceberam que era possível fazer cinema usando a bitola amadora (o Super-8). Torquato Joel e Bertrand Lira, diretores de Imagens do declínio ou beba coca, babe cola (1981) reconhecem o impulso que o filme de Pedro Nunes e João de Lima deu ao cinema paraibano, inclusive com influência decisiva para que eles realizassem essa película com uma visão ácida e jocosa sobre a presença de multinacionais no Brasil e as condições de vida de sua população.

Aquele momento de distensão política proporcionou o surgimento de grupos, entre outros, de militância sexual, que devido à forte repressão política, permaneceram em silêncio por quase duas décadas. Em João Pessoa, é criado o Nós Também, um grupo de militantes homossexuais que tinha uma proposta original: a de militar através da arte. No cinema, o grupo produziu o curta Baltazar da Lomba, em 1982. O filme documenta as denúncias feitas contra Baltazar, por sua homossexualidade, à inquisição portuguesa e vai mais além, ao levantar a discussão da ingerência do Estado na liberdade individual e a questão da formação da moralidade brasileira.

A discussão da sexualidade no cinema paraibano – que até então era “assexuado” – começa com Esperando João (de Jomard Muniz) em 1981 e passa por Perequeté, de Bertrand Lira, no mesmo ano, mas só vai atingir uma abordagem mais ampla com Closes, de Pedro Nunes. Misto de documentário e ficção, Closes contribuiu, inquestionavelmente, para uma ampla discussão da homossexualidade num momento de forte conservadorismo.

Com o rótulo de “cinema gay”, fruto de um período histórico menos totalitário, surgiram filmes como: Acalanto Bestiale, Miserere Nobis e Segunda Estação de uma Via Dolorosa, de Lauro Nascimento. Outro filme que traz essa temática é Era vermelho seu batom, de Henrique Magalhães, uma ficção rodada em Baía da Traição, baseado na maneira do cineasta ver a homossexualidade. O “cinema gay” desse período quebrou padrões dos temas até então abordados no cinema paraibano.

Claro, esse cinema gerou controvérsias, mas sua importância foi reconhecida ainda naquele momento pela ousadia no contexto político e social em que surgiu, contribuindo de certa forma, para tornar o super-8 um cinema respeitado entre aqueles que, até então, duvidavam de sua seriedade. Perequeté, por exemplo, é o retrato de um artista, o ator e dançarino Francisco Marto, atualmente radicado em Nova York, que fala abertamente, pela primeira vez num filme paraibano, do preconceito sofrido por sua orientação sexual e sua inserção no mundo artístico.

Graças a essa ação da Cinelimite, esses filmes ressurgem na tela grande pelas mãos do estadunidense William Cardoso-Plotnick (Diretor executivo da Cinelimite) e uma equipe de entusiastas: Glênis Cardoso (IDFB/Cinelimite), Matheus Pestana (Cinelimite), Laura Batitucci (IDFB/Cinelimite/ABPA), Débora Butruce (ABPA), Nátalia de Castro Soares (ABPA), numa junção de forças  com entidades como o Núcleo de Documentação Cinematográfica da UFPB (NUDOC) e os cineastas Henrique Magalhães, Bertrand Lira e Pedro Nunes.

Programação completa em https://www.cinemateca.org.br/series/mostra-cinelimite/

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