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O sexo profissional sem julgamentos morais em Donas de Alegria

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Com 16 curtas-metragens e 11 longas, a 11ª edição do My French Film Festival (MFFF) está na plataforma Petra Belas Artes à la Carte com quase 30 obras, com acesso gratuito até o dia 15 deste mês. A maioria dos filmes foi produzida entre 1919 e 2020, sendo nove longas inéditos no Brasil e o clássico Orfeu (1950), de Jean Cocteau, baseado no mito de Orfeu e Eurídice. A Unifrance, promotora da mostra, é uma agência do governo francês criada para a difusão da segunda cinematografia mais vista no mundo.

Donas de Alegria (Filles de Joie, 2019, Bélgica/França,1h30min), dirigido por Frédéric Fonteyne e Anne Paulicevitch, é um dos filmes da programação do MFFF dessa décima primeira edição. O filme conta a história de três amigas, uma delas, Dominique (Noémie Lvovsky) é uma dona de casa mãe de dois adolescentes e vivendo um casamento sem atropelos. As outras duas são Axelle (Sara Forestier), divorciada, mãe de duas crianças e vivendo com a mãe; e Conso (Annabelle Lengronne) uma imigrante senegalesa. Com temperamentos diferentes, elas convivem no trabalho entre tapas e beijos. As três cruzam a fronteira do norte da França com o sul da Bélgica para venderem seus corpos num discreto bordel.

Nenhuma das três tem o status da burguesa Séverine (Catherine Deneuve) em A bela da tarde (1967), filme de Luis Buñuel que tremulou a moral da época. E observem que estávamos na década da revolução sexual. O filme foi restaurado e relançado 50 anos depois sem as polêmicas de antes. A personagem de Deneuve se prostituía todas as tardes, submetendo-se a todo tipo de perversão, num prostíbulo de Paris, sem o conhecimento do marido apaixonado. O surrealista Buñuel mistura fantasia e realidade para relativizar a moral no quesito desejo e fantasias. Numa versão mais escrachada, temos A dama do lotação (direção de Neville D’Almeida, 1978), a partir de um conto homônimo de Nelson Rodrigues, retratando mulheres sexualmente insatisfeitas com seus maridos.

A referência dos filmes acima citados para acercar o francófono Donas de Alegria está apenas no fato destes filmes tratarem de histórias de mulheres que inexplicavelmente se prostituem. Em Donas de Alegria apenas a personagem Conso não vive com sua família. O único relacionamento mostrado é o dela com o cliente branco Jean Fi (Jonas Bloquet) de quem tenta a todo custo engravidar sem o conhecimento dele. Conso romantiza os encontros casuais com o bonitão sonhando com uma relação duradoura. Axelle e Dominique vivem com suas respectivas famílias e o sexo profissional não se apresenta como única saída para o sustento da família. Axelle, por exemplo, é o tempo todo assediado por seu ex-companheiro Yann (Nicholas Cazalé), pai de suas três crianças, que insiste em retomar a relação, o que vai engendrando seu maior conflito e desfecho trágico do filme.

Como uma prática milenar, a prostituição já foi na Grécia antiga uma atividade profissional regulada pelo estado como qualquer outra e incentivada pela família. De um modo geral, no entanto, é uma atividade moralmente condenável, quando não criminalizada em algumas sociedades. O que leva as amigas Axelle, Conso e Dominique a deixar seus lares clandestinamente para dar prazer a homens desconhecidos? Uma forma de sobrevivência? Mudança de status numa sociedade de consumo cruelmente competitiva? Infelicidade doméstica? Ou uma busca de sentido pela vida?

Axelle, como vimos, tem dificuldades para sustentar três crianças e a mãe. Dominique vive com marido e filhos. Apenas Conso é sozinha e paga suas contas com a venda do corpo em tempo cronometrado e com os tipos de prazer que pode ofertar. A psicoterapia do sentido da vida, a chamada Logoterapia, expõe a tese de que a procura pela prática da prostituição é uma forma de entender o sentido da vida, o que explica em parte o comportamento de Dominique, sobretudo, e Axelle. Para Conso, imigrante e negra, configura um caminho na luta desigual por trabalho e dignidade.

Igualmente, podemos perceber na escolha dessas mulheres uma busca pela liberdade, um exercício de livre arbítrio, com a coragem de enfrentar suas consequências (violência física e psicológica, riscos de contaminação, drogas e a condenação social). A responsabilidade pelos seus atos é essencialmente humana. E o sentido para a vida é único em cada ser humano e determinado no momento de sua existência. Daí, em Donas de Alegria, não podemos arriscar em atribuir a cada uma das três personagens a eleição de um sentido único para as suas existências.

O enredo inteiro é construído num flashback estrutural, ou seja, a ação da primeira cena acontece no tempo presente e todo o resto é uma narrativa do passado recente das personagens para, no seu desfecho, voltar à cena inicial. Em poucos momentos de alívio cômico do filme, Frédéric Fonteyne e Anne Paulicevitch flertam com o clichê. É quando, nos instantes de descontração no prostíbulo que trabalham, Dominique e Conso demonstram como fingem orgasmos com os clientes. O mérito do drama Donas de Alegria é tratar o tema sem juízos morais, malgrado um incidente coloque Axelle numa séria enrascada, que termina por envolver Conso e Dominique. O filme não defende nenhuma tese diante da complexidade do fenômeno que envolve questões de gênero, afirmação social, desejo de liberdade, sentido para a existência – questões que se colocam muito além das questões socioeconômicas usualmente atribuídas.

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