Não é de agora a difícil jornada dos cineastas para verem suas obras projetadas nas telas das salas de exibição no Brasil. Se nos anos 50 e 60, as chanchadas da Atlântida e os melodramas sofisticados da Vera Cruz, os maiores estúdios de cinema do país, atraíam multidões às grandes salas de cinema de rua, hoje essas salas estão confinadas aos shoppings, cada vez menores e mais elitistas e com raros filmes brasileiros em cartaz. E o que é pior, os bilhetes a preços inacessíveis para a maioria do consumidor.
Exponencialmente mais numerosa do que no tempo em que o cinema brasileiro era líder de bilheteria, a produção cinematográfica nacional está chegando ao público hoje não mais através da tela grande, mas de plataformas de streaming e tevês por assinatura. O nosso cinema só brilha na tela grande em salas alternativas de exibição, dentro de instituições e fundações de cultura. Uma dádiva a existência delas, mas não em quantidade suficiente para a expansão necessária do gargalo da exibição do cinema made in Brazil.
Na capital da Paraíba, é o Cine Banguê do Espaço Cultural quem atende o cinéfilo com um menu de excelente nível de filmes brasileiros e estrangeiros, numa sala confortável, com 120 poltronas, e uma boa projeção. Esperamos, apenas, que um dia resolvam a questão de toaletes dentro do cinema já que existe uma bateria deles no espaço posterior contíguo à sala. Pelo Brasil temos diversas salas, é preciso ressaltar, que cumprem essa função que o Cine Banguê faz tão bem. Em suma, precisamos de mais salas públicas do município, do estado e de fundações que fomentam a cultura.
Num texto publicado essa semana (ver link no final), o ator e produtor Cultural Buda Lira chama atenção para o que traz a Lei Paulo Gustavo: “a divisão de recursos por áreas da cadeia produtiva do audiovisual, essenciais para o setor, destacando-se o restauro, manutenção e funcionamento de salas de cinema, bem como o investimento na formação e capacitação do setor, para além do apoio direto à produção.” Este incentivo pode transformar salas históricas abandonadas à própria sorte em espaços para a difusão da nossa produção, colocando o público em contato com diferentes narrativas.
É interessante observar que a expansão do número de salas traz benefícios também para a economia porque envolve a construção civil, equipamento das salas com poltronas, projetores, sonorização e mão de obra para seu funcionamento. E o ganho mais significativo se dá na formação de público para o nosso cinema e em suas diversas linguagens e formas de expressão, contribuindo para a formação cultural de seu povo, um ganho inestimável. O cinema produzido hoje no Brasil revela a pluralidade de nossa cultura em suas diferentes manifestações.
O título dessa coluna cita, não por acaso, o contundente filme de José Eduardo Belmonte, ‘O pastor e o guerrilheiro’, uma produção de 2022 (treiler abaixo). Este longa-metragem do experiente diretor brasiliense (Belmonte dirigiu uma dezena de longas), estreou mês passado em diversas capitais. Aqui em João Pessoa, chegou primeiro no complexo de salas do Manaíra e do Mag shoppings com uma grande desvantagem em relação às superproduções estadunidenses: numa única sessão diária, notem, às 22h. Este tratamento desigual com o nosso cinema faz muita diferença para que o cinema brasileiro alcance seu público.
Aí está a diferença de colocar um filme numa sala pública. A estratégia do Cine Banguê, por exemplo, é a de disponibilizar os filmes da sua grade de programação em dias e horários diferentes ao longo de um mês, podendo reapresenta-los no mês seguinte. Felizmente, o cinéfilo da capital pode conferir este mês a história real que inspirou ‘O pastor e o guerrilheiro’ e se encantar com as excelentes atuações do camaleônico César Mello (como o pastor Zaquel) e Johnny Massaro, o guerrilheiro João, na sua luta desigual contra a nefasta Ditadura Militar. Em cartaz no Cine Banguê do Espaço Cultural.
Artigo de Buda Lira: