A morte precoce da cantora Marília Mendonça, na tarde desta sexta-feira, 5, deixou perplexo o Brasil todo. Não precisa ser um dos milhões de fãs da artista para sentir a tristeza pelo acidente aéreo que a matou, assim como a outras quatro pessoas (O tio e assessor da cantora, Abicieli Silveira Dias Filho; o produtor Henrique Ribeiro; o piloto Geraldo Martins de Medeiros e o copiloto Tarciso Pessoa Viana) que estavam no bimotor que caiu numa área de pedras e cachoeira na zona rural de Piedade de Caratinga, em Minas Gerais. Ninguém esperava algo assim.
A história de Marília, para além da “sofrência”, gênero que a levou ao estrelato, é comovente. Uma menina pobre que sonhava com o sucesso, trabalhava nisso desde os 12 anos, finalmente alcança o reconhecimento do público e em meio à agenda de compromissos para atender esses mesmos fãs que sempre buscou, morre.
Antes de embarcar para aquele que seria seu último compromisso, Marília deixou o filho, Leo, de dois anos, na casa do ex-marido, o também cantor sertanejo Murilo Huff, que cuidaria do garoto até seu retorno.
Ruth Moreira, mãe da cantora e entusiasta do trabalho dela desde sempre, passou mal ao saber da morte da filha. Nos tempos de dureza, ela comprava uma única cerveja e ocupava a mesa do bar a noite toda para fazer companhia à adolescente que se apresentava na noite e sonhava em ser querida pelas multidões.
Ainda no domingo passado, Marília estava no Domingão do Huck divulgando a turnê “As Patroas”, projeto dividido com as amigas Maiara e Maraisa e que tinha um pacote de shows vendidos para 2022.
Rainha da Sofrência, Marília Mendonça foi uma das responsáveis pelo “feminejo”, inclusão de mulheres no gênero até então dominado apenas por homens. A quebra de paradigma promovida por ela também chegou ao biotipo. Com sobrepeso, bem humorada e “grande’, ela destoava do padrão musa-fitness-sedutora que normalmente é esperado das “mulheres de sucesso”. Mas, recentemente, em mais um esforço, havia conseguido perder peso e estava praticando exercícios.
O sentimento de pesar de cada um de nós é imenso. Pela moça de 26 anos que batalhou tanto para chegar onde queria e, finalmente, desfrutava do sucesso quando foi arrancada da vida. Pelo filho pequeno que não voltará a encontrar sua mãe. Por dona Ruth, que sempre acreditou na capacidade da filha e a ela declarava seu amor em tantas oportunidades. E também pelos fãs que viam em Marília um exemplo de pessoa comum, guerreira, focada, “fora da caixinha” que venceu na vida, o que, em tese, pode acontecer com qualquer um que encontre seu talento e se esforce para tanto.
Marília era “gente como a gente” e é impossível não experimentar a tristeza por sua morte. A vida dela teve várias nuances do que se considera uma narrativa perfeita. Academicamente, acredita-se que recriar a “jornada do herói” (Joseph Campbell, 1949) é garantia de uma história que capture a emoção do público. Exemplo disso é que um dos itens do “monomito” é a recusa ao chamado. E nossa heroína que pensava em cantar pop rock no início contava ter sido “amaldiçoada” por um sujeito que previu sua futura opção pelo sertanejo, gênero com o qual ela não simpatizava no início da carreira. Mas, acabou aceitando o “chamado” que seria a chave para seu sucesso. Ela só não pôde experimentar por muito tempo a glória decorrente dele. Talvez seja culpa dos versos de um dos maiores hits da cantora: “Ninguém vai sofrer sozinho / Todo mundo vai sofrer”.