Adriana Crisanto

Jornalista profissional (DRT/PB n. 1455/02-99). Especialista em Jornalismo Cultural, mestre em Serviço Social (C.Política) pela Universidade de Salamanca e Universidade Federal da Paraíba (UFPB), com atuação na imprensa local.

Lado B de Bacurau

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Minha expectativa para assistir ao filme Bacurau, dirigido por Kleber Mendonça e Juliano Dornelles, foi uma verdadeira saga. Primeiro marquei com um colega para assistir nas salas comerciais de cinema da cidade, mas o mesmo me deu um “bolo” e não fui. Mas, como diz o ditado popular: “Há males que vem para o bem” e com um preço mais acessível acabei indo assistir no Cine Banguê do Espaço Cultural, que para minha surpresa estava lá uma fila quilométrica e uma desorganização danada. Comprava-se o ingresso com antecedência para a sessão anterior, mas para isso ficamos esperando o funcionário chegar para nos atender. Depois de longa espera na fila para comprar o bilhete enfim entrei. A sessão, que começou com atraso, devido a longa fila, contou a presença de um dos personagens do filme, que aparece anunciando a presença de alguns atores na sala de exibição. (ponto!)

“Bacurau” ainda é fruto das leis de incentivo cultural e apoio que os governos Lula e Dilma deram ao cinema do país e só agora pode ser exibido. O título filme faz referência a um pássaro, comum no sertão brasileiro, que costuma sair apenas a noite para caçar e era chamado pelos povos indígenas de “wakura´wa”. Pássaro este que se encontra em extinção na caatinga e cariri paraibano. Quando visto de dia ele se camufla entre as pedras e a vegetação, tornando-se “invisível” aos predadores. Os pernambucanos atribuem o nome do filme ao último ônibus que circulava em Recife na madrugada.

Esse nome “Bacurau”, onde moro em Tambiá, há muitos anos atrás, era dado a uma sessão de fofocas e contação de casos que os adolescentes faziam no batente da calçada de um terreno abandonado, colado a um muro, quando voltavam das festas ou do trabalho. A sessão de causos foi apelidada de “Bacurau”, por começar sempre depois das 23h, quando todos os vizinhos estavam dormindo ou assistindo televisão trancafiados em seus lares. Da janela do meu quarto escutava de longe os homens da rua a gargalhar e fofocar da vida alheia por horas. Quem disse, quem falou e quem viu ninguém sabia, eram todos “invisíveis”. As mulheres não participavam, era proibida entrada delas no clube da bolinha da rua.

Quanto ao o filme “Bacurau” é uma mistura de faroeste americano, ficção científica e terror ao mesmo tempo. Essa mistura de gêneros foi considera por alguns críticos como uma “ousada narrativa”. Evidente que como todo filme existe o lado bom e o lado ruim. Falar do lado bom é o que todos costumam fazer, mas detectar falhas e descompensações parece ser um pecado por ir de encontro aos amigos e colegas artistas. Mas, sejamos sinceros em vários momentos fica claro o dedo comercial da Globo Filmes, que deu um jeito de mercantilizar a produção para que pudesse ser consumido fora do país. Esse dedo metido acabou dando a Bacurau uma característica meia desalinhada. E ao que parece esse desalinho deu certo, pois foi indicado para participar de quatro festivais onde recebeu prêmios e indicações, como a indicação no Festival de Cannes ao Palma de Ouro. Nos festivais de Sidney, Munique e Lima venceu como melhor filme. Em Munique e Lima, indicado como melhor filme, já em Sidney como melhor filme e melhor direção em Lima.

Ele chama atenção por estar embutido um aspecto social e político forte e mostrar a resistência de uma comunidade, que está fora dos padrões de algumas cidades do interior nordestino, e que ainda luta contra todo tipo de exploração por parte dos políticos e empresas. As filmagens aconteceram no povoado de Barra, município de Parelhas e na zona rural do município de Acari, no Sertão do Seridó, Rio Grande do Norte. Em vários momentos vê-se a participação da comunidade que feliz retratou e deu a estética desejada. Para alguns o filme é perturbador pela mistura das mortes e pela “droguinha” em formato de pílula que os moradores tomam para se tornar “invisíveis”.

“Bacurau” poderia ter sido um longa-metragem, pois assim deixaria mais clara algumas cenas e passagens, como por exemplo, no personagem vivido pelo ator e diretor paraibano Buda Lira, que só sabemos que ele é casado quando tenta escapar da cidade depois de dedurar seus companheiros.

O filme conta ainda com a participação de atores paraibanos: Ingrid Trigueiro, Tardelly Lima, Jamila Costa, Dani Barbosa e Suzi Lopes. Está última a Rede Globo está perdendo em tê-la no seu casting de atores. Neste filme Suzy mostrou sua veia forte para o drama e a comédia. “Bacurau é um pássaro, não um passarinho”, diz ela em cena rápida com jeito debochado que só ela sabe fazer e que retira gargalhada da plateia. O elenco paraibano poderia ter sido mais e melhor aproveitado pelos diretores, pois eles mostraram que são bons realmente no que fazem e ainda o fazem sorrindo, pois todos foram lapidados no teatro.

A mistura em Bacurau é grande e algumas vezes exageradas como drone em formato de disco voador. Fato outro é que bem ou mal saímos daquela velha tradição do nordeste faminto para entramos no Nordeste faroeste caboclo cheio de ficção científica.

Fotos: Copyright Victor Jucá

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