A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta terça-feira (28) projeto que tributa as compras de até US$ 50 em sites estrangeiros, como as plataformas asiáticas Shein, Shopee e Aliexpress, com uma alíquota de 20%.
Hoje, as compras até esse valor são isentas da cobrança do Imposto de Importação e motivo de um embate que se arrasta há mais de um ano entre as empresas nacionais, as plataformas e o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A taxação foi incluída no projeto de lei que cria o Mover (Programa Mobilidade Verde e Inovação), um programa do governo para a descarbonização do setor automotivo. A votação nesta terça foi simbólica, quando não há contabilização dos votos.
Agora, o texto seguirá para o Senado, e deve ser apreciado na Casa nesta quarta-feira (29).
Inicialmente, o relatório do deputado Atila Lira (PP-PI) havia proposto acabar com a isenção de compras internacionais. Nesta terça, no entanto, ele apresentou dois pareceres: o primeiro com alíquota de 25% e o segundo, de 20%.
Esse meio-termo foi fruto de acordo selado na noite desta terça entre líderes da Câmara e o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e que teve o aval do próprio presidente Lula, segundo pessoas que acompanharam as negociações. Mais cedo, o alagoano se reuniu com o petista para tratar do assunto. Lula era contrário à taxação e chegou a dizer que vetaria o fim da isenção, caso o Congresso aprovasse.
Ao final do dia, Lira afirmou que o acerto foi “o possível para esse momento”. Questionado se esse tema poderia ser discutido num segundo momento, o presidente da Câmara disse que isso deverá ser tratado na regulação da reforma tributária.
“O segundo round virá na discussão da reforma tributária, nas questões de uma equiparação de impostos mais justos e mais claros para todo o setor produtivo. Então, nesse momento, é um passo importante que se dá. E aqui a nossa visão não foi contra ninguém, ninguém quer fazer nada contra ninguém, foi em socorro à empresa, à indústria nacional e aos empregos que ela gera de todos os brasileiros”, afirmou.
Os estados já cobram hoje uma alíquota de 17% nas compras internacionais de até US$ 50 por meio de plataformas online, e os governadores estudam subir a taxação para 25%, movimento que tem apoio nos bastidores do Ministério da Fazenda, de acordo com pessoas a par do tema.
Estudos da indústria nacional apontam que a taxação teria que ser entre 35% e 60% para garantir condições de igualdade das empresas brasileiras com os estrangeiros.
A Receita Federal tentou acabar com a isenção de pessoas físicas e taxar as compras com uma alíquota de 60% para fechar brechas para fraudes e sonegação nessas compras internacionais. A notícia repercutiu mal e serviu nas redes sociais para ataques de bolsonaristas ao governo Lula.
Na época, o governo teve acesso a pesquisas de monitoramento que apontaram que a grande maioria dos comentários sobre o assunto foram negativos. A pesquisa mostrou que uma ampla maioria dos comentários sobre o fim da isenção de impostos no envio de encomendas de até US$ 50 (R$ 250) do exterior foi negativa.
A primeira-dama Rosângela da Silva, Janja, e o PT foram contra o fim de isenção. O governo recuou e acabou criando o programa Remessa Conforme com a isenção para as plataformas que aderissem ao sistema.
As empresas nacionais (indústria e varejistas) não aceitaram e entraram com uma ação via CNI (Confederação Nacional da Industria) e CNC (Confederação Nacional do Comércio), o que aumentou a pressão. A FPE (Frente Parlamentar do Empreendedorismo), com forte presença de representantes dos varejistas, se mobilizou para que o Congresso aprovasse a taxação.
Antes da votação nesta terça, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, acusou o governo Jair Bolsonaro de ter criado o problema da isenção do Imposto de Importação. Segundo ele, o governo passado transformou “o contrabando em política de Estado”.
“Penso que o Congresso tem que dar uma resposta a um problema que não foi criado agora. Foi criado pelo governo anterior, que transformou o contrabando em política de Estado. Não se fez nada. É curioso como ninguém cobra isso”, atacou. “O contrabando foi oficializado no Brasil e as coisas tomaram essa proporção. Agora o Congresso está tomando para si a tarefa de mediar. E é papel do Congresso fazer essa mediação. Não vai recair sobre um partido ou um líder. Tem que ser uma mediação social”, afirmou.
Para o ministro da Fazenda, essa não é uma questão que poderia ser tratada do ponto de vista partidário e, sim, sobre o ponto de igualdade de condições de competição.
“O Congresso está fazendo uma mediação entre os vários interessados e o melhor é tratar o problema como uma questão de Estado. E não como uma questão ideológica menor. Uma questão de Estado. Estado brasileiro que está protegendo, na medida correta, a competição em condições isonômicas, iguais de competição. É disso desde o começo que se trata”, disse Haddad após conversar com o presidente Lula antes da votação do projeto.
O Mover, projeto em que a taxação foi inserida, é uma das prioridades do governo e foi criado no início do ano, por uma medida provisória, que tem validade na próxima sexta-feira (31). Por isso, o governo tinha pressa para aprovar a matéria.
Ele sucede o programa Rota 2030 e busca ampliar as exigências de sustentabilidade da frota automotiva e estimular a produção de novas tecnologias nas áreas de mobilidade e logística. Um dos objetivos é incentivar a descarbonização, promovendo combustíveis alternativos.
Empresas habilitadas no regime poderão usufruir de créditos financeiros se realizarem gastos em pesquisa e desenvolvimento e investimentos em produção tecnológica realizadas no país.
Os créditos estão limitados a R$ 3,5 bilhões em 2024, R$ 3,8 bilhões em 2025, R$ 3,9 bilhões em 2026, R$ 4 bilhões em 2027 e R$ 4,1 bilhões em 2028.
O projeto também cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico (FNDIT), para apoiar programas do setor. Ele será instituído e gerenciado pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Folha Online